segunda-feira, 2 de julho de 2012

Ensine seu filho que a humanidade só pode ser feliz se todos forem felizes, alerta Frei Betto


Diante de um auditório do Sindicato dos Engenheiros do Estado do Rio de Janeiro completamente lotado, o Frei Betto avisou: é fundamental que a família e a escola apresentem às crianças referências de admiração que não sejam aquelas mesmas apresentadas pela TV.

A observação fez parte da palestra organizada pelo Instituto Alana sobre infância, ética e valores, que o escritor, frade dominicano e pilar da luta contra a ditadura no Brasil comandou na tarde dessa quarta-feira (21).

O evento fez parte da programação da Cúpula dos Povos e destacou os pilares que sustentam o consumismo infantil, além das consequências dessa forma de controle sobre as crianças.

Betto iniciou apontando qual o caminho para tornar uma criança consumista. Segundo ele, o primeiro passo é destruir o caráter sonhador, substituindo pela erotização precoce. “Se vocês prestarem atenção, as crianças de quatro, cinco anos, já prestam atenção demasiada no próprio corpo e já apresentam um grande salto para o consumismo: começam a se pintar, exigir produtos, marcas e grifes. Assim, o que deveria acontecer na cabeça aos sete, começa aos três. Está biologicamente infantil, mas psicologicamente adulta.”

Com isso, explicou, há a transferência do universo onírico para a televisão, que passa a sonhar pelo pequeno telespectador. Isso faz com que a infância seja excessivamente solitária, já que na TV prevalece o processo do monólogo, não há interação.

Frei Betto também ressaltou que a obsesidade infantil e a banalização da agressão e da violência são outros resultados da pressão dos meios de comunicação sobre as crianças..

O processo – Domesticada a se tornar consumista precocemente, Frei Betto explicou que a criança passa a ter medo de entrar no mundo real e se sente muito vulnerável porque não esgotou o universo onírico. “Essa é a candidata ideal às drogas”, defendeu.

Nesse processo, ressalta, o valor é atribuído aos objetivos e dão vazão a uma frustração muito difícil de ser sanada, quando não é possível ter acesso a um produto. Aí começam os conflitos entre o desejado e o não alcançado. “Na minha geração não tínhamos tanto dependentes porque éramos viciados em utopia”, comentou, ao abordar a importância de manter os sonhos vivos na mente das crianças.

A publicidade, por sua vez, joga do outro lado, minando a autoestima. “Ficamos o tempo todo ouvindo que somos uns merdas porque não fizemos a viagem, porque não temos o carro, porque não compramos a bebida”, explica.

Ele define esse mecanismo como hipnose coletiva. “No início, a TV emitia cultura e logo percebeu que isso não atraia tanto público. Daí, descobriu que o negócio é o entretenimento, que não toca a consciência, como a cultura, mas os sentidos.”

O que fazer

Como em outros debates nas tendas da cúpula, no Aterro do Flamengo, Frei Betto destacou que não há outra saída a não ser lutar pela mudança de paradigma da sociedade, nocivo à felicidade humana. Um processo que envolve muitas dificuldades.

“É uma dura batalha árdua, eles querem formar consumistas, nós queremos formar cidadãos. Chegamos ao ponto em que, ao invés de levar a um parque, aos finais de semana os pais levam ao shopping. Para a pós-modernidade, fundada no Mercado, os únicos valores são pecuniários”.

O Estado, por sua vez, deve promover a regulamentação da publicidade infantil, como forma de combater a exploração do consumismo sobre um público ainda em formação. Medida que países como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra e Alemanha já adotaram e que é fundamental ao desenvolvimento sustentável por definir uma nova forma de produção e consumo

Globalização da solidariedade

Para Betto, a saída à essa forma de opressão é a organização e o debate coletivo. “O que faz uma pessoa se sentir bem é o sentido, que imprime em seu caminho, o seu valor. E quem incute esses valores são a família, a religião, a escola e o Estado. Acontece que a pressão da mídia, o primeiro poder, influi nesses quatro. Por isso, precisamos estar enturmados para ter pensamento crítico. Isolado a gente vira presa fácil da proposta do Estado”, definiu, apontando a importância de organizações como sindicatos.

Sobre a escola, Frei Betto acredita ainda a publicidade deveria ser discutida nas salas de aula. E, para os pais, ele alerta sobre a necessidade de fortalecerem princípios que estabeleçam metas ancoradas em grandes sonhos.

“É preciso resistir para não trocar os sonhos por desejos palpáveis. É preciso não ficar indiferente aos milhões que não tiveram a mesma sorte biológica que nós e compõem a imensa maioria de pobres. E é preciso incutir no seu filho que a humanidade só pode ser feliz se todos forem felizes. Temos que curtir a globalização da solidariedade.”


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